18 de novembro de 2011

O dia em que Karl Marx pegou o busão

No ônibus em São Paulo. Distraído, bato o olho na frase do cartaz:
“No trânsito do capital, a preferência é da vida”.
Refeito do assombro inicial, passo a ruminar a mensagem. Num período de breves segundos, acompanho o inusitado percurso da sociologia, que deixa o confinamento da Torre de Marfim acadêmica e se mistura à prosaica rotina do trabalhador. Na volta para casa, cansado da labuta, o cidadão é presenteado, pela prefeitura da metrópole, com uma joia do pensamento sociológico. Pérolas aos povos!
Causa espanto e admiração a capacidade de síntese do autor: a denúncia do capitalismo, da voracidade dos especuladores, da lenta destruição das relações humanas. Poesia, sociologia e ciência política são condensadas numa frase que, destrinchada, renderia dissertação de mestrado.
Súbito, ergo os olhos, noto que o cartaz é uma edição do Jornal do Ônibus. Campanha educativa. Releio a frase, e aí me dou conta do pequeno tropeço na leitura, que me fez – para continuar com a imagem do trânsito – ignorar a “preferencial”:
“No trânsito da capital, a preferência é da vida”.
E assim Marx viveu seu momento de proletário. Um momento breve, já que aristocrata nenhum é de ferro.