26 de maio de 2011

Júlio Medaglia

Náo me contenho, e interrompo as micro-férias do blog para dar a dica. Uma entrevista, da revista Brasileiros, com um dos caras mais importantes de nossa música, de uma lucidez impressionante. Aqui.

23 de maio de 2011

Um livro... e pausa

Eu tinha 11 anos quando um de meus manos chegou em casa com um disco novo, Geraes, de Milton Nascimento. Caçula, eu ouvia tudo de segunda mão, demoraria alguns anos pra ter a iniciativa de escolher um LP de meu próprio gosto. Ok, foi tocado à exaustão, mas Geraes foi pra mim um divisor de águas. Mercedes Sosa, Chico Buarque e outros que participaram do disco, eu agora ouvia de modo diferente. Ler ficha técnica de disco virou hábito.

Muita água rolou, e muita parceria idem. Anos depois, descubro um livro que me atira no túnel do tempo: Os sonhos não envelhecem – Histórias do Clube da Esquina, de Márcio Borges (Geração Editorial). Entrou atropelando os que estavam em minha fila de leitura. Primeiro parceiro de Milton, Márcio faz uma espécie de biografia sentimental do amigo Bituca, praticamente adotado pela família Borges. Com grande lirismo e despretensão no estilo.

Se canções como Clube da Esquina, Clube da Esquina nº 2, Menino (ainda mais comovente quando se sabe o contexto em que surgiu), Equatorial, Morro Velho, Sentinela etc fizeram parte de sua trilha sonora, taí um livro imperdível. E a boa notícia: não é todo dia que um livraço desses (também no tamanho: 370 páginas), trazendo um CD de bônus, é relançado e vendido por R$ 30.

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Faço uma pausa. Devo voltar no início de julho. Até lá.



20 de maio de 2011

"Os livro"

A polêmica envolvendo o livro Por uma vida melhor continua rendendo. Começa com reportagens e comentários equivocados: segundo estes, o MEC estaria dando sinal verde a uma obra que valida pessoas que dizem “Os livro”. Dio Santo, problema de leitura, e grave, aqui. No jornal de hoje, mais dois exemplos assustadores. Transcrevo:

“Nada mais representativo da burrice do que essa teoria do falar errado” (...) “‘Não discrimine quem fala errado. Ele está certo’. Discriminação é chamar quem ensina certo de errado.”
José Sarney, na Folha.

“Rosa, Adoniran, Gullar, João Cabral, Lalá e Bananére não fizeram escola, nem esta era sua intenção. Continuaram únicos. Artistas podem e devem fugir da norma. Já os professores e linguistas têm de aderir a ela, como meros funcionários da língua que são”.
Ruy Castro, na mesma página.

“Teoria do falar errado”?! “Funcionários da língua”?! Cabe a ótima argumentação de um linguista, a esse respeito. Aqui.




19 de maio de 2011

Memórias póstumas

“Nunca pensei que uma casa sem telefone e internet pudesse levantar suspeitas. Isso no Brasil é tão comum, principalmente para aqueles que assinam esses serviços”.

Do Blog do Bin Laden (Blogs do Além).

18 de maio de 2011

Pra acabar

Início dos anos 1990, surgia o CD. Logo seguido dos porta-CDs, adequados ao formato, de onde acostumamos a tirar o disco pra tocar. Beleza.

Dia desses, tou de bobeira na seção de discos da Fnac, e deparo com um, com o qual vinha flertando: Feito pra acabar, de Marcelo Jeneci.

Primeira audição terminada, vou colocá-lo na prateleira e... êpa! Peraí, mudaram o formato do troço?

Sim e não. Inverteram a coisa. Tudo estaria ok se o formato fosse quadrado. Agora, você tem duas opções: ou coloca invertido na estante, e daí não pode ver de qual álbum se trata, ou então inventa um porta-CDs exclusivo pra esse novo formato – criado por algum gênio da raça.

No mundo da publicidade, papo corrente é “quebrar paradigmas”. Taí um caso em que, farto da tradição, o sujeito espatifou, esmigalhou os paradigmas. Vai ser “diferenciado” assim na Casa do Carvalho!







16 de maio de 2011

Dos mistérios

Por um instante, coloque-se em meu lugar, caro leitor. Você termina de assistir a um filme, na tevê. Ainda sob o efeito da última cena, ao som de Cole Porter, muda de canal, indo direto pra TV Cultura. Na tela, dá de cara com uma mulher, na varanda da sua casa, falando sobre a obra literária dela e... sobre você.

Cena no estilo Big Brother, não lhe parece?

Breve flashback. Sábado à noite, releio trechos de “Conversations with Woody Allen”. Aumenta a vontade de ver alguns filmes dele, de rever outros. Na tarde do dia seguinte, zapeando pela programação, me dou conta que passarão dois de Allen, A era do rádio e Anything Else. Escolho o segundo.

Última cena do filme, o jovem escritor está no táxi, e o motorista, ao deparar com o rapaz falando sozinho, diz “O quê?”. Resposta: “Nada não, só estava pensando como a vida é cheia de mistérios”.

Foi quando zapeei e dei de cara com a Mulher. Programa Entrelinhas, gravado há alguns meses, cá na roça. Em depoimento intercalado com outros escritores, revela ao público o seu primeiro leitor (baita privilégio, o desse cara, você não calcula).

Uma “sinc” saborosa, que mereceu celebração com um golinho de vinho do Porto.




O revisor na moita

“O brasileiro é cordial! A penúltima placa que o Gervásio pendurou na empresa em São Bernardo: ‘Aqui não é festa de rodeio pra usar botina e calça justa socada no rego, se eu ver alguém aqui vestindo essas joças, vou fazer esse caubói fora da lei virar uma eguinha pocotó na festa de Barretos. Conto com todos. Assinado: Gervásio’. Seguuuuuura peão!”

(Coluna de Zé Simão, na FSP de hoje).


Fictícia ou não, a placa traz uma construção interessante. Repare que Gervásio não diz “se eu vir”, no subjuntivo, como mandaria a norma culta.

Claro. Nem Gervásio, nem você, nem ninguém (ok, consigo imaginar umas duas ou três exceções, talvez os mesmos que mantêm o “cujo” em sua fala) diz:

“Ok, se a gente se vir amanhã, eu te entrego o livro.”

Taí um caso em que a obrigação do revisor é ficar na moita. Ponto para Zé Simão.



11 de maio de 2011

Eça

“(…) Na cidade findou a sua liberdade moral; cada manhã ela lhe impõe uma necessidade, e cada necessidade o arremessa para uma dependência; pobre e subalterno, a sua vida é um constante solicitar, adular, vergar, rastejar, aturar (...) a sociedade logo o enreda em tradições, preceitos, etiquetas, cerimônias, praxes, ritos, serviços mais disciplinares do que os de um cárcere ou de um quartel.
(...)
Mas o que a cidade mais deteriora no homem é a inteligência, ou porque lha arregimenta dentro da banalidade, ou lha empurra para a extravagância. Nesta densa e pairante camada de idéias e fórmulas que constitui a atmosfera mental das cidades, o homem que a respira, nela envolto, só pensa todos os pensamentos já pensados, só exprime todas as expressões já exprimidas; ou então, para se destacar na pardacenta e chata rotina (...), inventa num gemente esforço, inchando o crânio, uma novidade disforme que espante e que detenha a multidão como um monstrengo numa feira.”

A cidade e as serras, Eça de Queirós.

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Primeira reação: por que demorei tantos anos pra descobrir este livro? Seguida da resposta, tão natural quanto óbvia: os encontros – com livros e pessoas – acontecem no momento apropriado. Sempre.


9 de maio de 2011

Benito de Paula

Ao deparar com esse nome, o que lhe vem à mente? (Se não viveu os anos 1970, provavelmente nada).

Foi a pergunta que fiz a pessoas próximas, e as reações foram surpreendentemente positivas.

Fato é que Benito era (ou ainda é) considerado um dos grandes expoentes da música cafona. Seu visual só fazia piorar o estigma.

Recentemente, ele foi entrevistado no Metrópolis. Na revista Fórum deste mês ele também é tema de um belíssimo artigo, de Pedro Alexandre Sanches.

Benito é de uma época em que meus filtros musicais ainda não estavam em atividade. Época da inocência. A música me entrava pelos poros; portanto, eu mal sabia julgar, “bom”, “ruim”, “brega” etc. Posso ainda cantarolar várias de suas composições, que grudaram no ouvido.

Entre outras revelações do artigo, Benito se defende do rótulo de “adesista” ao regime militar. Pois, em plena ditadura, compôs: “Tudo está no seu lugar, graças a Deus”. Explica, na entrevista, a gênese do verso. Mas imaginem dizer uma coisa destas numa época de repressão braba, em que o vilão era tão bem definido. Época em que ouvir o Rei, ou canções não-engajadas, era sinal de alienação.

A origem de seu nome de batismo (Uday Vellozo), a menção de seu nome numa canção-sátira de Rita Lee, sua relação com grandes nomes da MPB, sua postura modesta, quase autodepreciativa, e muito mais, está tudo lá. Um artigo a ser guardado.

Em tempo: adoro quando querelas no universo musical se transformam em canção (Caetano vs. Lobão etc). Trago, então, um episódio que não está no artigo. Reza a lenda que “Argumento”, composição de Paulinho da Viola, é um recado direto a Benito: “Tá legal, eu aceito o argumento / mas não me altere o samba tanto assim/ Olha que a rapaziada está sentindo a falta de um cavaco, de um pandeiro ou de um tamborim”.

Lenda? Bem, si non è vero, è bene trovato...

6 de maio de 2011

Cujo


a.      “O irlandês Colm Tóibín, de quem está chegando ao país o romance Brooklyn, fala sobre a experiência da imigração”.
b.      “O irlandês Colm Tóibín, que o romance Brooklyn está chegando ao país, fala sobre a experiência da imigração”.
c.       "O irlandês Colm Tóibín, cujo romance Brooklyn está chegando ao país, fala sobre a experiência da imigração".
Qual das frases acima você acha que foi publicada no jornal (é fato: uma delas saiu no Estadão)?
Se respondeu, sem titubear, letra c, errou. É o que naturalmente se esperaria, já que o “cujo” é o conectivo adequado à norma culta. Estivesse eu na situação de revisor, mui provavelmente faria a sugestão de alterar, na forma da frase c.
Porém...
O redator do jornal optou pela alternativa a. Eis um simples reflexo do destino que “cujo” vem tomando na língua, o mesmo do Tiranossauro Rex. Da língua oral, ele praticamente desapareceu. Na escrita, ainda resiste, mas agonizando.
O fato de um jornal com a tradição do Estadão trazer uma construção como essa aponta para um sinal interessante, de novos ares na língua.
Em tempo: a frase b lhe soa estranha? Bem, é como falariam zilhões de brasileiros, na linguagem cotidiana.

4 de maio de 2011

Chile, Fukushima, EUA...

Cancioneiro (14)
“Buliram muito com o planeta
O planeta como um cachorro eu vejo
Se ele não guenta mais as pulgas
Se livra delas num sacolejo”.
“As aventuras de Raul Seixas na cidade de Thor”, de Raul Seixas. Álbum Gita, 1974.

2 de maio de 2011

Utopia

1.       Eduardo Galeano, escritor uruguaio, no programa Sangue Latino, da TV. Pergunta do entrevistador: “Ainda faz sentido, ter utopias, no mundo de hoje?”. Ele responde com uma historieta contada por um amigo, numa palestra. Historieta e frase que muitos atribuem, equivocadamente, a ele mesmo. “Me dizem: mas a utopia é como o horizonte! Você caminha 10 passos, o horizonte se distancia 10 passos; caminha 20, o horizonte se distancia 20. Pra quê, então, serve a utopia? Ora, serve para isso: para caminhar”.
2.     Horas antes, leio entrevista com Miguel Nicolelis, na revista Brasileiros de abril. Seguida de reportagem sobre o fascinante trabalho desenvolvido por sua equipe no Instituto Internacional de Neurociências de Natal Edmons e Lily Safra, em Natal e Macaíba (RN). Dezesseis páginas, com várias passagens de dar nó na garganta. Do artigo assinado por Nicolelis: “O impossível continua ao nosso alcance. Mas para tornar o impossível em factível, é preciso inovar com a liberdade e ousadia do pensamento mágico das crianças”. Declaração que dialoga diretamente com o que Galeano falava, há instantes, sobre a poesia do universo da criança (aniquilada por aquilo que chamamos de "crescimento" e “desenvolvimento”).
3.      Livro de Nicolelis, a ser lançado em junho (Cia. das Letras), e que já me deixa com a ansiedade de um guri em véspera de Natal: Muito além do nosso eu.