11 de fevereiro de 2012

A arte de lidar com o ego

1.       Stardust Memories, de Woody Allen (Memórias, na infeliz tradução brasileira, ou Recordações, na versão portuguesa), de 1980.
2.      Valter Ego, personagem de Angeli, anos 1980.
3.      Beatriz, livro de Cristóvão Tezza (Ed. Record), de 2011.

O que têm em comum, as três criações?
Vejamos. O filme que W. Allen lançara um ano antes, Manhattan, foi elevado à categoria de cult. O diretor nunca foi tão badalado e assediado. No ano seguinte, tematiza em Stardust Memories a transformação de um diretor em celebridade do mundo do cinema. Tirando um tremendo sarro do episódio todo, para deleite de quem o acompanha, sabe de sua aversão aos holofotes e conhece seu autodeboche característico.
Valter Ego. Angeli, numa entrevista dos anos 90, se a memória não me trai, comenta o contexto em que se deu a criação do personagem. Diz que estava num momento de pico na carreira profissional, e estava começando a se achar o maioral. Para poder lidar com as ilusões proporcionadas pela paparicação generalizada e pela fama (lembram-se do baita sucesso do gibi Chiclete com Banana, anos 80?), deu vida ao topetudo Valter Ego.   
Cristóvão Tezza. Seu livro O filho eterno, de 2007, rapou todos os prêmios literários do ano seguinte. O escritor ganhou projeção nacional, que aliás não se limitou ao Brasil. A obra foi vertida para o inglês (por Alison Entrekin, a mesma que verteu Cidade de Deus) e publicada pela Ed. Scribe, na Austrália. Pois bem, em 2011, Tezza publica Beatriz. Logo nas primeiras páginas, a longa e impactante fala do escritor-personagem Paulo Donetti (uma impiedosa autocrítica) diante da plateia de um evento literário faz um contraponto na medida justa à situação vivida pelo escritor, de ter sido alçado ao status de celebridade.
Como veem, o que acabo de escrever não passa de um aperitivo. Assistam ao filme. Revisitem as tirinhas de Angeli. Leiam ambos os livros de Tezza. Belos exemplos da habilidade destes artistas para lidar com o fumacê produzido pelo ego.