30 de setembro de 2011

Dia do Tradutor

Em tempos bicudos como os nossos, é um bálsamo deparar com gente generosa.

“Para mim, traduzir um bom ou um mau redator dá a mesma satisfação. Tenho prazer em traduzir texto mal escrito. O desafio é maior. A luta é maior. O triunfo, mais saboroso”.

Danilo Nogueira, tradutor. Depoimento dele, em seu blog.

28 de setembro de 2011

Estreia...

... nova categoria no blog: n’importe quoi. Literalmente, a expressão francesa significa “qualquer coisa, não importando exatamente o quê”. Mas seu sentido mais comum se aproxima do whatever, em inglês. Em português, nonsense pode servir como sinônimo. Que ainda acho fraco: n’importe quoi sintetiza muito bem a bizarrice de uma situação.
Vamos lá, então. Caetano Veloso inaugura a seção, em grande estilo. Notícia do jornal de hoje:
Caetano tenta vetar 'Tropicália' como nome de condomínio

Caetano Veloso quer impedir o uso do termo "tropicália" para batizar um conjunto de prédios de alto padrão que está sendo erguido pela Odebrecht, em Salvador.
(...)
"Um empreendimento imobiliário rentabilíssimo [que] não está fazendo algo diferente de usar a força dessa difusão como publicidade para seu produto. Configura um uso parasitário de minha imagem pública. De resto, não gosto da febre de condomínios fechados no litoral ao norte de Salvador", disse.
A advogada Simone Kameneitz, que representa Caetano, disse já ter notificado a empresa para mudar o nome do empreendimento. Se o pedido não for atendido, o cantor vai processar a Odebrecht. A Odebrecht Representações, que disse não ter sido notificada, não pretende mudar o nome do condomínio porque o vocábulo "Tropicália" não pertence a Caetano.

27 de setembro de 2011

Vocapeople


Octeto vocal. Fazem música a capella, ou seja, sem instrumentos. Comentários como os que li, na mídia francesa, do estilo “Um talento colossal”, sempre me deixam com um pé atrás. Bem, fui conferir.
Arrebatador. Não encontro outra palavra para resumir o espetáculo. Saí do teatro em estado de graça.
Em 1h30, o grupo faz um medley de canções pop dos mais variados estilos, incluindo árias de óperas. Intercalam as canções com breves gags, interagindo com a plateia.
O que chama a atenção é que, sob o pretexto de serem “seres intergalácticos”, se comunicam com o público praticamente sem usar a língua (quando o fazem, isso se dá ora em francês, ora em inglês); dão prioridade ao gestual e, claro, à música.
Visito o site deles, e descubro, entre outras coisas, que o octeto (de origem israelense), é composto por 24 cantores, que se revezam, três de cada naipe (dois “naipes” fazem a percussão vocal). É o que lhes permite apresentar-se simultaneamente em Nova York e em Paris. Na capital francesa, a temporada atual dura 6 meses, de 4ª a domingo, e num teatro com capacidade para... 850 pessoas! (Só de pensar no espaço dedicado à música vocal entre nós... bem, melhor nem pensar).
Na página deles no Facebook, você encontra uma amostra do trabalho do grupo.
Vontade de voltar a Paris só para vê-los novamente. Quem sabe (delírio, quimera...) um empresário amalucado ainda traz o grupo a Pindorama.


26 de setembro de 2011

O rebelde

Neste livro, Osho faz uma longa e detalhada caracterização dos três tipos de pessoas dispostas a "mudar o mundo": o reformista, o revolucionário e o rebelde. O trecho abaixo é um retrato que traduz com enorme fidelidade o que tem sido a minha busca.
“As qualidades do rebelde são multidimensionais. Primeiro, o rebelde não acredita em nada a não ser na própria experiência. A verdade dele é sua única verdade: nenhum profeta, nenhum messias, nenhum salvador, nenhuma santa escritura, nenhuma tradição antiga pode lhe dar a verdade. (...)
Um rebelde respeita sua própria independência e também respeita a independência de todas as outras pessoas. Ele respeita a sua própria divindade e respeita a divindade de todo o universo. Todo o universo é seu templo – é por isso que ele abandonou os pequenos templos feitos pelo homem. Todo o universo são suas sagradas escrituras – é por isso que ele abandonou todas as sagradas escrituras escritas pelo homem. Mas não é por arrogância, é para empreender uma humilde busca. O rebelde é tão inocente quanto uma criança.
A segunda dimensão será não viver no passado, que não existe mais, e não viver no futuro, que não existe ainda, mas viver no presente com a máxima consciência e espírito alerta que se possa conseguir. Em outras palavras, viver consciente no momento. (...)
A terceira dimensão é que o rebelde não está interessado em dominar os outros. Ele não tem avidez pelo poder, porque essa é a coisa mais feia do mundo. (...) É essa avidez pelo poder que acaba levando aos conflitos, às competições, à inveja e finalmente às guerras. (...)
O rebelde penetra no seu mundo interior de olhos abertos, sem nenhuma ideia do que está procurando. Ele continua polindo sua inteligência. Continua tornando seu silêncio mais profundo, sua meditação mais profunda, para que o que quer que esteja oculto dentro dele venha à superfície; mas ele não tem ideias preconcebidas sobre o que está procurando.
Ele é basicamente um agnóstico. Essa palavra tem que ser lembrada, pois ela descreve uma das qualidades mais básicas. Existem crentes que acreditam em Deus, existem ateus que não acreditam em Deus e existem agnósticos que simplesmente dizem, ‘Não sabemos ainda. Vamos buscar, então vamos ver. Não podemos dizer nada antes de termos procurado em todos os recônditos do nosso ser’. O rebelde começa com ‘eu não sei’. É por isso que eu digo que ele é como uma criança pequena, inocente”.
Transformando crises em oportunidades, de Osho. Ed. Cultrix, tradução de Denise C. Rocha Delela.

21 de setembro de 2011

Em Liliput

Mãe internada, passo algumas horas no quarto do hospital, como acompanhante. Volta e meia tiram o paciente do sossego. Uma injeção aqui, um exame ali, e assim vai. Noto que, independentemente do sexo, há entre os enfermeiros um modo comum de tratamento dos idosos.
– Vamos lá? Ok, devagar, agora. Levanta a perninha.
– Me dá o bracinho. Isso, assim mesmo.
– Não deu certo. Vamos ter que pegar outra veinha. (apurei o ouvido: isso mesmo, não era veiazinha, ou véinha).
E dá-lhe agulhinha, camisolinha e xixizinho.
Me imaginei paciente com 85 anos de idade, soterrado por tantos -inhos.
Corta pr’um flashback. Em A bolsa amarela, de Lygia Bojunga, a protagonista Raquel (pré-adolescente, pelo que lembro), a certa altura, desabafa:
– Por que é que todo mundo fala comigo desse jeito, no diminutivo? Será que acham que não entendo, se falarem de maneira normal?
Sei não, mas desconfio que ainda exista uma porção de velhos (vamos lá, direto ao ponto, “pessoas da Terceira/ Melhor Idade” é de lascar) com o espírito de Raquel. Ou será que Liliput é aqui?

19 de setembro de 2011

Badalação

Matéria do Suplemento Literário do Estadão aborda a ansiedade em torno do resultado do Man Booker Prize, “o mais prestigioso prêmio literário da língua inglesa”, que será anunciado em outubro. Bem a propósito: O menino que odiava mentira, de M. J. Hyland (Companhia das Letras, tradução de Angela Pessoa), que acabo de ler, foi finalista deste prêmio recentemente. Comprei atraído pelo texto da orelha. A Mulher leu primeiro e devorou. Pois bem. Houve dois momentos em que a leitura ameaçou decolar, o segundo deles lá pela pág. 280. Mas não passou de ameaça. Só insisti porque a sinopse era pra lá de interessante, e paguei pra ver se seria surpreendido na reta final. Nada.
Dia desses, Anna V., editora e tradutora residente no Rio, dedicou um longo post a Liberdade, de Jonathan Franzen, e à badalação em torno da obra. Quando um livro vira unanimidade e ganha comentários como “O livro do ano”, e autor ganha capa da Time etc, é de desconfiar. Vale ler o post-resenha de Anna, que caminha na contramão do que todos andam dizendo.
Cânone da literatura ocidental? Clássicos que não posso deixar de ler? Balela. Mais vale confiar no próprio faro e sair bailando no Bloco do Eu Sozinho.

14 de setembro de 2011

Confiança

Vi acontecer em Berlim, há oito anos, mas achei que seria uma questão de tempo para os alemães caírem na real. Que bom que me enganei.
A cena se repetiu em Munique. Você compra o bilhete do S-Ban (uma espécie de metrô de superfície) e deve validá-lo na maquininha à entrada da estação. Tudo aberto, não há catracas. De quando em quando, um fiscal entra no vagão, pra verificar se você cumpriu as normas. Se estiver sem o bilhete, ou se não o validou, é multa pesada.
Claro que deve ter gente fraudando. Mas o bacana é que, mesmo com as eventuais trapaças, o recado subliminar seja: “Até que prove o contrário, você merece confiança”.

12 de setembro de 2011

Munique

Coisas de país rico. À saída do aeroporto, notamos que o táxi que nos levará ao hotel é uma quase réplica do Match-5, do Speed Racer. Em via expressa até o centro, alcançava 160, 170 km/h, fácil.
Ao volante, o motorista turco, residente no país há 20 anos, soltava cobras e lagartos contra os alemães.
Dirigir um BMW ou uma Mercedes-Benz é fato banal na Bavária (região mais rica e cara da Alemanha, contam). Tanto que eles são deixados na rua à noite, nenhuma neura em relação a estacionamento.
Na rodovia em direção a Neuschwanstein (o castelo em que Walt Disney se inspirou), além da grata surpresa de ver uma ciclovia longuíssima e mui bem cuidada, ladeando a estrada, carros conversíveis pra todo lado. Num deles, num dia ensolarado, uma loiraça ao volante, cabelo esvoaçante.
Cena como essa, só em filmes do Elvis.

9 de setembro de 2011

Intimidade

As respostas que eu daria, em inglês, às perguntas da imigração alemã estavam pré-formuladas. Ensaiado, o roteiro do que dizer ao oficial de ar sisudo, mas gentil e polido.
Ao desembarcar, a surpresa. O destino era Munique, mas sendo um voo com escala em Madri, o controle se dá na Espanha.
“Hay que sacar los cinturones!”, urrava a oficial espanhola, marchando impaciente de um lado para outro. Meu inocente e casto cinto, vou ter que tirar? Estou magro, afinal; e se a calça cair? Ok, vamos lá.
O oficial me revista, manda esvaziar os bolsos, apalpa aqui e ali. As apalpadelas prosseguem, chegando à região... da virilha. Controlo para não gargalhar, de cócegas. Desconfiava de dólares na cueca? Sei lá. Sei que a verificação foi quase erótica. Melhor nem olhar para o rosto do homem, pensei, vai que é uma paquera.
Aterrissamos em Munique, e cadê o controle de imigração? Nada, portas escancaradas.
A tarefa estará a cargo dos espanhóis por ser uma questão... de pele, um lance assim meio latino? Vá saber.

8 de setembro de 2011

De volta à roça

Depois de duas semanas de um tremendo lufa-lufa, perambulando por Munique e Paris, volto ao silêncio e ao convívio com a bicharada.
A rigor, falar sobre a viagem é cair no vazio. Nenhuma palavra, imagem nenhuma é capaz de descrever o que vivi nestes dias. O primeiro impulso é me render ao silêncio, deixar isso tudo decantar, ver se sobra algo para ser dito.
Sensação de ter de fazer uma redação com tema livre. Ou pior, com o tema “Minhas férias” (quem não passou por tamanho horror?).
Fato é que não tenho de fazer coisa alguma. Isso me alivia.
No devido tempo, portanto, os posts começarão a pipocar.