13 de março de 2011

Da futilidade do bate-boca e da argumentação

Debate por um alojamento

Em alguns templos Zen japoneses, existe uma antiga tradição: se um monge errante conseguir vencer um dos monges residentes num debate sobre budismo, poderá pernoitar no templo. Caso contrário, terá de ir embora.

Havia um templo assim no norte do Japão, dirigido por dois irmãos. O mais velho era muito culto e o mais novo, pelo contrário, era tolo e tinha apenas um olho.

Uma noite, um monge errante foi pedir alojamento a eles. O irmão mais velho estava muito cansado, pois havia estudado por muitas horas; assim, pediu ao mais novo que fosse debater: “Solicite que o diálogo aconteça em silêncio”, disse o mais velho.

Pouco depois, o viajante voltou e disse ao irmão mais velho: “Que homem maravilhoso é seu irmão. Venceu brilhantemente o debate. Assim, devo ir-me embora. Boa noite”. “Antes de partir”, disse o ancião, “por favor conte-me como foi o diálogo”.

“Bem”, disse o viajante, “primeiramente, ergui um dedo simbolizando Buda. Seu irmão levantou dois dedos, simbolizando Buda e seus ensinamentos. Então, ergui três dedos para representar Buda, seus ensinamentos e seus discípulos.  Daí, seu inteligente irmão sacudiu o punho cerrado na minha frente, indicando que todos os três vêm de uma única realização”.

Com isso, o viajante se foi.

Pouco depois, veio o irmão mais novo, parecendo muito aborrecido.
“Soube que você venceu o debate”, falou o mais velho. “Que nada!”, disse o mais novo, “esse viajante é um homem muito rude”” . “É?”, disse o mais velho. “Conte-me qual foi o tema do debate”.

“Ora!”, exclamou o mais novo, “no momento em que ele me viu, levantou um dedo insultando-me, indicando que tenho apenas um olho. Mas por ser ele um estranho, achei que deveria ser polido. Ergui dois dedos, felicitando-o por ter dois olhos. Nisto, o miserável mal-educado levantou três dedos, para mostrar que nós dois juntos tínhamos três olhos. Então, fiquei louco e ameacei lhe dar um soco no nariz – assim ele se foi”.

O irmão mais velho riu.

Nem água, nem lua - Osho fala sobre dez histórias Zen. (Ed. Cultrix, tradução de Ma Prem Arsha).