4 de fevereiro de 2011

BBB

Uma crônica antiga, de Castelo, bastante apropriada para o momento. Um post dedicado a Andrea Del Fuego.

A casa dos existencialistas

E se, num delírio fantasioso, o BBB fosse formado apenas por filósofos contemporâneos?

DOMINGO

Husserl está particularmente nervoso hoje. Sartre o irrita, a todo momento, gritando que seu conceito de transfenomenalidade estaria furado. Heidegger procura acalmar Husserl, mas este está enfurecido demais para ouvi-lo. O saco de pancadas passa a ser Hannah Arendt. Husserl diz, aos brados, que ela não entende – na essência – o conceito de arte analógica exposto na Estética, de Hegel.
Na copa da casa, completamente nu, Husserl grita o título do livro em alemão para pirraçá-la (Vorlesungen über die Ästhetik!, Vorlesungen über die Ästhetik!). Hannah, humilhada, chora nos braços de Heidegger. Sartre, juntamente com Foucault, começa a xingar Heidegger de nazista. Nem mesmo a intervenção de Peirce – que estava trancado no sótão há dias escrevendo para um colóquio em Berlim – evita que Heidegger esbofeteie Sartre e seja surrado por Foucault e Merleau-Ponty.
O Ibope vai às alturas.

SEGUNDA-FEIRA

Merleau-Ponty é eliminado da casa.
Sartre e Simone preparam um macarrão à bolonhesa para o almoço. Tudo está calmo, Husserl joga tranca com Peirce; Foucault toma banho de roupa. É quando vêm os gemidos do quarto maior. Logo depois gritos, quase uivos. Todos se levantam e vêem o inevitável. Hanna e Heidegger transam no beliche, debaixo de um lençol branco. As câmeras logo se deslocam para lá e mostram tudo. Heidegger tenta esconder o fato dizendo que a subjetividade é atrelada a um conceito ontológico e difere da realidade por razões imanentes.
Sartre procura ridicularizar Heidegger, mas Peirce começa a falar sobre vindicação do processo indutório e todos se dispersam pela casa.

TERÇA-FEIRA

Curiosamente Peirce e Husserl são eliminados do programa, em vez de Hannah e Heidegger. Parece que a ligação física dos dois aumenta a audiência. Husserl se queixa à direção da emissora. Ele acreditava piamente que sairia vencedor recebendo a coleção "Tesouro da Juventude" no final.

QUARTA-FEIRA

Foucault tem um surto. Depois de ler por 48 horas uma tese sobre a dialética da metafísica em Frege, repentinamente arranca o pêndulo do relógio da sala (o tiquetaque irritante foi o detonador da loucura) e sai com ele nas mãos, agredindo Sartre, Simone, Hannah e Heidegger – que continuavam fazendo sexo e estudando Fenomenologia sem parar.
Foucault, amarrado a uma camisa-de-força, é eliminado do programa.

QUINTA-FEIRA

Heidegger e Sartre ficam na sala jogando xadrez. Hanna e Simone vão tomar banho de sol na piscina. Heidegger e Sartre empatam a partida. A audiência cai pela metade. O público deseja cenas de maior intimidade entre os filósofos. O diretor do programa pede que Simone e Hannah se dispam durante o banho de sol. Ou então que Heidegger simule homossexualismo tardio e se insinue para Sartre. Todos discordam. Heidegger e Hannah são eliminados.

SEXTA-FEIRA

Depois de ler trechos de Schopenhauer no banheiro, Sartre tenta suicídio. Sobem oito pontos na audiência. Simone é eliminada.

SÁBADO

Sartre fica sozinho na casa e vence o jogo. Recebe a cobiçada coleção "Tesouro da Juventude" e promete lançar em breve o CD "O Inferno são os Outros", que será vendido nas bancas a preços populares.